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Ibama emite licença prévia para BR-319 na Amazônia

Organizações apontam motivação política em licença concedida sem viabilidade econômica e ignorando recomendações técnicas do próprio Ibama.

BR-319
Foto: Observatório BR-319

Na última quinta-feira (28), o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama) concedeu licença prévia para reconstrução de uma parte da BR-319, que liga Manaus, no Amazonas, a Porto Velho, em Rondônia. Ambientalistas denunciam que a decisão, sem as condicionantes necessárias, levará diversos prejuízos para a região. Entre eles, aumento do desmatamento.

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Há muito tempo a rodovia BR-319 é palco de embates. Conhecida como Rodovia Manaus–Porto Velho, a estrada corta terras indígenas demarcadas e unidades de conservação. Vários estudos de impacto ambiental já foram rejeitados pelo Ibama, mas agora, sob gestão de Eduardo Bim, algo mudou. Portanto, entidades ambientais cobram transparência e participação da população local, afetada pelas obras.

Para o Observatório BR-319, a medida “é um dos maiores retrocessos em termos de respeito aos direitos dos povos da floresta e à democracia”. Isso porque libera a criação de projetos para obras no Trecho do Meio (entre os quilômetros 250 e 655,7) sem a consulta prévia dos povos indígenas e comunidades tradicionais, extrativistas e ribeirinhas.

“Vemos com grande preocupação a emissão da Licença Prévia neste momento de disputa eleitoral, a decisão tem evidente motivação política e eleitoreira”, afirma a secretária executiva do Observatório BR-319 (OBR-319), Fernanda Meirelles.

BR-319
Foto: Observatório BR-319

Inviável

Uma das questões que reforçam esta tese é que apesar da comemoração efusiva do presidente Jair Bolsonaro, pelas redes sociais, assim como políticos da região do Amazonas, não há recurso aprovado no orçamento da União para a execução da obra. A recuperação da área é estimada em um bilhão de reais.

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Para que a obra saia do papel também ainda serão necessárias as licenças de instalação e operação.

Para o diretor da WCS Brasil, organização membro do OBR-319, Carlos César Durigan, é impossível concordar com a viabilidade ambiental da licença prévia. “Basicamente não temos garantias das agências ambientais sobre as ações de fiscalização, controle e monitoramento, nem da obra em si e seus impactos diretos. Muito menos dos tantos problemas já registrados e relatados às instituições envolvidas, como tem sido o caso de abertura de ramais, ocupação de terras públicas destinadas – unidades de conservação e terras indígenas – e não destinadas, que têm levado a uma explosão da degradação e desmatamento em toda a área de influência da BR-319”, diz.

Segundo Durigan, seguir o processo de modo correto demanda sim tempo e paciência, porém “fazer de modo capenga vai levar a mais questionamentos e não deve agilizar o asfaltamento, e sim gerar aberturas a processos jurídicos. Além do que, irá repercutir de forma negativa no cenário nacional e internacional”, ressalta.

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rodovia BR-319
Área de influência da BR-319 tem recordes de desmatamento e focos de calor em 2021. | Foto: Orlando K. Júnior

O Observatório BR-319, que não é contra a reconstrução da rodovia, se posiciona na defesa de um processo de licenciamento transparente, democrático e inclusivo, que ouça os moradores dos territórios ocupados ao longo da rodovia. Leia a nota completa da organização aqui.

Já o Observatório do Clima contextualiza que a estrada foi aberta sem qualquer licença ambiental ainda na década de 1970, durante a ditadura militar, mas foi abandonada no final dos anos 80 devido aos altos custos de manutenção e do baixo tráfego. Sua reconstrução atende a uma das promessas de Jair Bolsonaro para a região e a licença é concedida faltando pouco mais de 60 dias para as eleições presidenciais.

Nova fronteira de desmatamento

O aumento do desmatamento é uma das possíveis consequências da licença concedida sem os devidos cuidados. Por isso, em 2008, o então ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, estabeleceu “pré-condicionantes” para o licenciamento da BR-319. Foi criado um Grupo de Trabalho com representantes do Ibama, do MMA, do ICMBio e do órgão ambiental do Estado do Amazonas que criou recomendações técnicas a serem adotadas.

Das dez recomendações incluídas no relatório, oito são medidas que deveriam ter sido efetivadas antes da concessão da licença prévia, mas não foram. Ou seja, a licença contraria às recomendações de seus próprios servidores.

“A pré-condição mais importante (para emissão da licença) era a instalação de 16 Unidades de Conservação (UCs), de um lado e de outro da estrada, antes de qualquer coisa”, disse o ex-ministro ao Observatório do Clima. O objetivo, segundo Minc, era evitar a explosão do desmatamento que havia ocorrido após a construção de outras estradas na Amazônia, como a BR-163 (Cuiabá-Santarém).

Outros problemas foram apontados em um estudo da UFMG: a pavimentação de 400 km do trajeto, aprovadas na licença, vai estimular fluxos migratórios, expansão de atividades agrícolas, ocupação e valorização de terras, aumentando em pelo menos quatro vezes o desmatamento até 2050.

Tais preocupações já podem até ser embasadas com dados recentes. O desmatamento disparou na região nos últimos cinco anos e, em 2022, dois municípios do Sul do Amazonas, Apuí e Lábrea, região de influência da BR-319, foram os campeões de alertas de desmatamento.

BR-319
Foto: Observatório BR-319

Um relatório publicado em fevereiro deste ano apontou que 15%, dos 1.036.550 de hectares (ha) desmatados na Amazônia Legal, foram perdidos na área de influência da rodovia BR-319, que teve um aumento de 41% no desmatamento em relação a 2020.

Por fim, o governo federal ainda prevê regularizar áreas com indícios de grilagem na BR-319. O projeto faz parte do Plano do Ministério da Economia e foi revelado em uma reportagem do InfoAmazonia, confira.

Com informações do Observatório BR-319 e Observatório do Clima.